20.10.07

um grão de real

Por vezes, é preciso afastarmo-nos um pouco do objecto para que ele possa brilhar (ou ofuscar-se) a uma outra luz. Escrevi há algum tempo, neste mesmo blog, algumas considerações sobre o filme de Carlos Saura, intitulado "Fados". Nessa altura, procurei sobretudo destacar um conjunto de singularidades ( e mesmo virtualidades) que, a meu ver, o caracterizavam.

Não retiro o que disse, mas gostaria de acrescentar algo a partir do que considero, hoje, a sua "limitação". Essa limitação não reside, por exemplo, na falta de beleza. É um filme bonito, de diversos pontos de vista. Uma bem sucedida coreografia.

Porém, da dança das imagens e do sons, bem como da pose dos músicos convidados, fica-nos a impressão de um "final" - como se diz da prova dos vinhos - em que falta, por assim dizer, um grão de real.

Um grão de real não torna o objecto mais belo, mas, pelo contrário, mais rugoso, áspero, irregular ou até mesmo dissonante. É aquilo que não se encontra jamais num postal ilustrado: o que está antes ou depois da beleza e, por isso, mais perto da vida.

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