14.4.09

Felicidade e contingência

Há cada vez mais livros (eventos, programas, workshops...) que se propõem revelar a fórmula ou a receita da felicidade. O princípio (quando a coisa é minimamente séria e não mera charlatanice) é que existe uma fórmula (ou um método) passível de ser transmitido de "mestre" a "discípulo", mas também que cada um de nós é ou pode tornar-se "digno" ou "merecedor" da felicidade.

É contra esta ideia (ingénua, absurda ou oportunista) que se insurge, por exemplo, o filósofo italiano Giorgio Agamben num pequeno texto intitulado "Magia e Felicidade". Segundo ele, a felicidade teria mais a ver com uma certa "magia", impossível de prever ou controlar, e que não resulta de qualquer espécie de prémio ou merecimento por um trabalho bem feito. A felicidade, quando acontece, tem algo de excessivo, fora da norma e perfeitamente contingente e inesperado.

Num lugar à beira rio, na cidade de Lisboa, há um bar com uma esplanada. Chama-se: À Margem. Como estava frio lá fora, decidimos ficar na parte de dentro daquela autêntica janela aberta para o rio Tejo.

Entretanto, começou a chover. O sol a pôr-se banhava o rio a jusante enquanto chuva, a montante, escurecia o seu lado oposto.

De súbito, os presentes soltam um "oh" de admiração, encaminhando-se mecanicamente, um após outro, em direcção à rua. Foi então que reparámos, com assombro, naquela verdadeira epifania: por entre a chuva e a luz, o céu envolto em nevoeiro e a dança das ondas, um arco-íris, de cores magistrais, re-pousava nas águas mesmo à nossa frente. E como se não bastasse, um segundo arco-íris, embora menos nítido, veio juntar-se ao primeiro.

Os elementos concertaram-se entre si para criar aquele momento de "magia". Saíram todos, felizes - e não só os que mereciam - de telemóvel em riste para fixar aquele momento único.

Nós também ficámos, felizes, a olhar. Sem máquina fotográfica, sem telemóvel, pois há momentos, únicos, que têm mesmo de ser vividos.

Nunca tínhamos visto nada assim!