27.8.07

A nossa necessidade de consolo é (im)possível de satisfazer

Por vezes, basta fazer um simples corte ou uma suspensão numa palavra para que ela ganhe um sentido completamente novo e até mesmo oposto.

Stig Dagerman é um autor sueco nascido em 5 de Outubro de 1923, a Norte de Estocolmo. Após falhar várias tentativas de suicídio, acaba por passar ao acto em 4 de Novembro de 1954, terminando desta forma abrupta uma carreira literária breve e fulgurante.

Um dos seus livros tem como título: A Nossa Necessidade de Consolo é impossível de satisfazer (Värt Behov av tröst), segundo a versão portuguesa de Paula Castro e José Daniel Ribeiro.

Quando se olha a coisa do ponto de vista do impossível, tudo o que possa existir de consolo (a que o autor, metaforicamente, chama "presa") é escasso e fugaz: "se sou solitário, uma mulher amada, um desditoso companheiro de viagem. Se sou poeta ou prisioneiro - um arco de palavras que com assombro reteso, uma súbita suspeita de liberdade. Se sou ameaçado pela morte ou pelo mar - um animal vivo e quente, coração que pulsa sarcástico; um recife de granito bem sólido" (Fenda, 2004, p. 15).

No fundo, é a lógica do desejo humano: sempre aquém do seu objecto, ou relativamente ao qual todo o "objecto" é insatisfatório. Mas é também a lógica da impotência: haveria um consolo, uma satisfação absoluta, relativamente à qual somos impotentes.

Se mudarmos, porém, de ponto de vista, aquilo que nos aparecia como pouco, "escasso e fugaz", em relação ao "impossível", aparece-nos agora como aquilo que há, nem muito nem tempo, e de onde retiramos algum "gozo": o gozo possível.

Acontece que este ponto de vista não é natural: acaba por ser mais atractiva a lógica da (in) satisfação. A vida dá lenha aos que querem arder nesse fogo.

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