30.1.12

A autoridade de Freud

O último filme de David Cronenberg, Um Método Perigoso, está longe, a meu ver, de conseguir ombrear com outras obras maiores do realizador. De todos os seus filmes, talvez seja este o que menos me entusiasmou.

Na altura em que Freud inventou o "método" que Jung iria pôr à prova na sua jovem paciente (e amante) Sabina Spielrein (Keira Knightley), o "perigo" advinha da ligação entre o "sintoma" e a "sexualidade". Após um século de "talking cure" ("Um Método Perigoso" é baseado na peça "The Talking Cure", do dramaturgo e argumentista inglês Christopher Hampton) e de progressiva exposição e banalização da sexualidade, onde reside o "perigo"? Será ainda a "cura pela palavra" um método suficientemente "perigoso"?

Se este não é, de longe, o filme mais bem conseguido de David Cronenberg, ele está, no entanto, recheado de pormenores interessantes. Eu diria até que o mais interessante está nos detalhes (o que não deixa de ser psicanaliticamente ajustado) e não no todo. E um dos detalhes prende-se com com uma questão bastante atual e comentada: a autoridade.

Poderíamos resumir o nosso tempo através de um paradoxo: ao mesmo tempo que não paramos de destituir ou revelar as fraquezas das "autoridades" constituídas, lamentamos a autoridade perdida e sonhamos com mais "autoridade". Mas o que é a "autoridade"? Como se ganha ou se perde a autoridade? É nisto que um pormenor do filme de Cronenberg é assaz revelador. A certa altura, quando Jung, após ter contado um sonho a Freud, que este interpretou, lhe pede o troco, ou seja, que ele interprete por sua vez  o sonho que tivera, Freud recusa, dizendo que teria para tal de entrar em confidências íntimas que lhe fariam perder a "autoridade".

É uma "denegação", para usar um termo do próprio Freud". Ao dizer que não entra em mais pormenores para não perder a autoridade (de pai?) sobre Jung, de certa forma, ele já começou a perdê-la. O elo que os liga, como sabemos, começará progressivamente a romper-se de forma inexorável.

Freud mostra, contra a sua vontade, que a autoridade é da ordem da aparência (do "semblant", como diria Lacan) e não do real. Mesmo se, como poderíamos dizer, é uma aparência necessária. Por isso, a autoridade tem pés de barro. Eis uma das razões por que na sociedade da "transparência" em que vivemos, já não se respeita mais - ou cada vez mais se respeita menos - "a autoridade" das autoridades.

Mas será a via da autoridade (do pai) o método da psicanálise ou, como nos ensinou Lacan, a via do sintoma? Do sintoma próprio a cada um. Do sintoma onde reside o perigo e, ao mesmo tempo, o que nos mantém.

Desse ponto de vista, se Freud é ainda hoje uma referência, porventura uma bússola, não é porque ele tenha ocultado a Jung os pormenores de um sonho (para manter a autoridade), mas porque não abriu mão do seu sintoma (a psicanálise). O que é perigoso, hoje, é não abrir mão  da singularidade do sintoma (de cada um) na era da avaliação, do questionário, da média estatística (se pode medir-se, logo existe), enfim, da uniformização ou catalogação dos nossos (des)arranjos. O método continua a representar um perigo  que muita gente gostaria de eliminar de vez.

5 comentários:

Pedro Aniceto disse...

Notei um decrépito
funcionário aduaneiro,
vestindo um antigo
uniforme imperial.

E eu o olhava subir
e descer com sua melancolia
e expressão infeliz, quando
alguém me disse:


"Ele não está lá.

Ele é um fantasma que não
descobriu como morrer direito."

Curioso o sonho de Jung..."uniforme" ,ou seja, a única forma (talking cure) que tanto o perturbava...

Samuel disse...

parabéns pelos seus textos. apesar de inapropriada e com muito menos rigor que os seus textos - pensamento em acção - vertido e alinhado - é um balsamo. para quem o lê. sincero obrigado samuel guimaraes

João Luiz Pereira Tavares disse...

Sonho brasileiro realizado:


A volta de decoro no Brasil:

UM MOMENTO, APENAS UM!, SUI GENERIS. EIS:

Em 2016 houve fato fabuloso sim, apesar de Vanessa Grazziotin falar que não, dessa forma assim:

"O ano de 2016 é, sem dúvida, daqueles que dificilmente será esquecido. Ficará marcado na história pelos acontecimentos negativos ocorridos no Brasil e no mundo. Esse é o sentimento das pessoas", diz Grazziotin.

Mas, por outro lado, nem que seja apenas 1 fato positivo houve sim! É claro! Mesmo que seja, somente e só, um ato notável, de êxito. Extraordinário. Onde a sociedade se mostrou. Divino. Que ficará na história para sempre, para o início de um horizonte progressista do Brasil, na vida cultural, na artística, na esfera política, e na econômica. 
Que jamais será esquecido tal nascer dos anos a partir de  2016, apontando para frente. Ano em orientação à alta-cultura. Acontecimento esse verdadeiramente um marco histórico prodigioso. Tal ação acorrida em 2016 ocasionou o triunfo sobre a incompetência. Incrementando sim o Brasil em direção a modernidade, a reformas e mudanças positivas e progressistas. Enfim: admirável. 

Qual foi, afinal, essa ação sui-generis?

Tal fato luminoso foi o:

-- «Tchau querida!» [impeachment de Dilma].

Eis aí um momento progressista, no ano de 2016. Sem PeTê.

Feliz 2017.

Krim Pemutih Wajah disse...

Very nice article. I like that your simulations capture the pump/crash market cycle that is so prevalent in cryptocurrency markets.

Portuguesito disse...

PUTUGAL E UMA MUTACAO!TUDO PORTUGUESITO QUER VIVER NO PRESENTE NAO NO PASADO!!
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I enjoy telling the World the TRUTH about Portugal's state of reality: The Biggest Global Economic Collapse in History! Everybody is leaving Portugal to live in former Third World Colonies in order to eat. Our Racist/Xenophobic way of life we enjoyed for centuries has come back to bite us bitterly. It has been downhill since we separated from Spain in 1640 and BET our futures on the Pirate thieving British who only looked out for themselves and left us in the Cold. And, the proof is Britain just left Europe to look out for themselves yet AGAIN! We Portuguese are VERY Stupid people that NEVER learn from our Ignorant ways!!

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