16.7.10

A polémica vai continuar

Afinal de contas, Freud está vivo, continua vivo. Os mortos não são, em princípio, atacados. A não ser por vandalismo.

Quem o prova é o filósofo Michel Onfray: um dos homens do momento, pelo menos em França, pois em Portugal, como dizia há pouco tempo Eduardo Lourenço, nem uma palavra sobre o assunto. O significante "crise" é por aqui hegemónico, não se falando praticamente de outra coisa. A nossa pobreza não é apenas económico-financeira, por certo.

No seu último livro - Le Crépuscule d'une idole. L'affabulation fredienne - ele aplica a Freud o método que já aplicara à história da filosofia: virar do avesso, desmontar, destituir...até fazer ressaltar os podres de um sistema, de uma teoria, de uma "lenda".

Michel Onfray é um filósofo para quem a "biografia" não é mera paisagem ou música de fundo. No seu livro "Puissance d'exister", por exemplo, ele faz anteceder as suas reflexões de uma extensa nota autobiográfica onde mostra como a filosofia que se faz não se pode desligar da pessoa que se é, que se foi, que se veio a ser.

Sob o desejo de "cientificidade" da psicanálise freudiana, ele descobre afinal uma "auto-biografia" do seu autor, uma (má) filosofia... daquele que tanto quisera demarcar-se desta última.

Dizia Lacan que é aquele que odeia - e não o que ama - que melhor sabe ler. Percebe-se que não é propriamente o amor aquilo que move Michel Onfray. Por isso, há esperança de que ele saiba ler...todos aqueles que destitui, sejam os velhos filósofos ou o velho Freud.

Mas também é verdade - sendo claro, como diz o próprio Onfray, que a (auto)biografia conta e que o ódio é uma das marcas que ficaram indelevelmente gravadas da sua passagem pelo famoso orfanato da infância, dirigido por salesianos, mesmo que ele diga e repita que não guarda qualquer ressentimento - que faz sentido perguntar, como é o caso de Elisabeth Roudinesco, "mas porquê tanto ódio"?

Se é verdade que o ódio - como mostrou Freud - não é propriamente o contrário do amor (Cf. Pulsões e Suas Vicissitudes), pois o contrário deste é a indiferença, sabemos ao menos que, por enquanto, Freud não é indiferente ao filósofo Michel Onfray.

E a coisa vai, por isso, continuar a mexer, a dar que falar.

2 comentários:

Selma Calasans Rodrigues disse...

Estou gostando desse impasse Onfrai/Freud/Lacan Acho que vai terminar bem para Freud...

Selma Calasans Rodrigues disse...

Onfray, desculpem-me