1.3.10

Um homem sério

No último filme dos irmãos Coen, "A Serious Man", há um estudante universitário que tenta subornar o seu professor de física (Larry Gopnik), que o acabara de chumbar na respectiva cadeira. Como "homem sério" que é, Larry Gopnik não aceita o suborno; em vez disso, tenta explicar ao aluno a razão pela qual o chumbou: ele não domina a matemática e sem esta não é possível avançar na física.

Lição de Galileu: se o universo está escrito em caracteres matemáticos, mais do que "compreendê-lo", de buscar um "sentido" para ele, importa saber escrever, equacionar, reduzi-lo à fórmula matemática. Mesmo se Larry Gopnik desenha no quadro negro dois gatos (Schrödinger) para ilustrar o famoso "princípio de incerteza", ele explica ao referido aluno que o essencial não é isso,  mas antes a possibilidade de tratar a "incerteza" por meio da "escrita" matemática. Uma das imagens impressionantes do filme mostra, precisamente, o quadro negro completamente coberto de letras, de fórmulas matemáticas.

Porém, o que faz Larry Gopnik quando a sua mulher pede o divórcio e toda a sua vida começa literalmente a desmoronar, sem razão aparente, como se o céu e a terra conspirassem contra ele? O mesmo que toda a gente: busca um sentido, uma razão para aquilo, junto de quem é suposto-saber: no caso, recorrendo a três rabinos. Para um homem formado na ciência mais exacta (apesar de o "princípio da incerteza" parecer sugerir outra coisa), na "racionalidade" mais exigente, aquilo que lhe acontece é causa de grande perturbação, uma vez que parece ser rebelde a toda e qualquer lógica "causal", não existindo aparentemente nenhuma "razão" que o justifique. Para quem defendia junto do aluno que o tentou subornar que as nossas acções têm consequências, nada na acção de Gopnik parece justificar uma tal consequência. Ele confronta-se aqui com a ilogicidade: nenhuma causa, nenhuma razão suficiente. Tal como Job, a famosa personagem bíblica, ele parece ser "castigado" por um crime que não cometeu.

Finalmente, tal como veio, sem razão, aquilo que lhe acontece também se foi. Sem razão. Como se, na (i)lógica da vida, nem tudo fosse escrito ou pudesse ser escrito previamente ou de uma vez por todas. Mesmo que não se pare de sonhar com isso, que cada qual vá forjando um sonho para si mesmo. Um sonho de que que a vida - ou os "pesadelos", como acontece no filme - se encarrega de nos despertar.

1 comentário:

Alda disse...

Vou ter que ir ver filme...