21.11.10

Tormenta

Tive há algum tempo atrás a oportunidade de ver uma exposição de Isabel Garcia na sala de Exposições temporárias do belo Mosteiro de Alcobaça, património da humanidade. O título da exposição remete para a "tempestade" que tanto pode agitar os elementos (físicos) como as ideias. Além disso, ela pode ser vista como uma metáfora dos tempos que correm: (a)tormentados pelas mais diversas "tempestades".

Mas aquilo que me interessou, acima de tudo, não foi tanto a desordem dos elementos que se manifesta através de raios metálicos, pedras de chuva e estrelas (espalhadas, como restos, ao longo da sala de exposição), mas o "poço de luz": uma estrutura cilíndrica em forma de poço, revestida interiormente por vidro espelhado, de tal modo que umas poucas lâmpadas acesas no seu fundo, davam a impressão de se multiplicarem até ao infinito, irradiando luz em todas as direcções.

Parece que o escritor japonês Tanizaki (1933) tinha razão: a estética ocidental está voltada para a luz. E não só a estética! Há que iluminar tudo, varrer a sombra do mundo! o imperativo do "olho absoluto"  não dá tréguas (ver entrevista, ao lado, de Gérard Wajcman).

Tal imperativo mostra-se, até, nas mínimas frases, ditas (por exemplo) pelo professor X ao aluno Y: "Ele é um menino apagado".

Isto quer dizer: ele não se chega à frente, não se expõe como os outros (na era da exposição), não gosta dos brilho dos holofotes, preferindo a sombra.

O poder da luz é aqui tão forte - tão inconscientemente forte - que até aqueles que não brilham por se chegarem à frente, por serem como os outros, querem brilhar por serem diferentes, mas querem brilhar de qualquer maneira.

É verdade que também há aqueles, em número crescente, que não querem, que preferem não, que não desejam brilhar desta ou daquela forma e que se deixam simplesmente ficar. Apagados.

Resposta, irónica, à luz, ao olho absoluto que (a)tormenta o século XXI?

Sem comentários: