Começo por esclarecer a minha posição para que não restem mal-entendidos, ainda que o mal-entendido faça parte integrante da condição do ser falante (e falado).
No próximo dia 11 de Fevereiro, votarei sim. Não, pela hipocrisia.
Dito isto, lanço três questões em forma de dúvida:
1. Não seria o referendo desnecessário se houvesse um pouco mais de coragem política?
2. Num país onde nascem cada vez menos crianças (nota-se já nas escolas secundárias e nas universidades onde a oferta execede largamente a procura) e onde as que nascem encontram cada vez mais dificuldades e faltas de apoio ( são raros os infantários condignos e a preços acessíveis para as famílias que têm, como dizia hoje o nosso ministro da economia na China, Manuel Pinho, "baixos salários") será que o "aborto" é a prioridade, a grande questão mobilizadora do país?
Não deixa de ser irónico que o governe se prepare, dizem alguns, para acabar com o subsídio de nascimento e dar luz verde ( quem sabe se um subsídio) às clínicas privadas que entretanto se vão (ou já estão) a instalar no país.
Em breve, por este andar, a grande dificuldade não vai ser abortar mas convencer alguém a ter um único filho que seja! Conheço cada vez mais casais que "decidiram" não ter filhos...
Diferentemente do que Freud acreditava, a mãe é cada vez menos "certa". As mulheres são cada vez menos mães. "Já tenho de aturar os filhos dos outros e não são pera doce", dizia uma.
3. Tem-se visto (ou ouvido) a nível argumentativo uma certa confusão entre "despenalização" e "desculpabilização". No entanto, os dois termos não querem dizer a mesma coisa nem são redutíveis um ao outro. A despenalização remete para uma lei (que deve ser alterada); a desculpabilização, pelo contrário, é de uma outra natureza. A culpa (ou a desculpa) não se referenda, não começa nem acaba com a mudança (formal) da lei, por mais desadequada ou injusta que ela seja. A culpa pressupõe um sujeito que seja capaz (mesmo que inconscientemente, isto é, não o reconhecendo como tal, mas manifestando-o de um modo ou de outro) de responder por um acto.
Interromper "voluntariamente" a gravidez é, além de tudo o mais, um acto...que carece de subjectivação, seja qual for a lei em vigor.
Sem comentários:
Enviar um comentário