1.10.07
Descascando a cebola da culpa
A ideia não é nova: gozamos mal porque sentimos culpa. Daí que haja uma tendência, cada vez mais acentuada, de desculpabilização. Não se trata exactamente de pedir desculpa (pois quem pede desculpa ainda se sente culpado) ou de expiá-la, mas de apagar, rasurar, fazer desaparecer a culpa. No limite, o sonho é poder agir sem culpa. Fazem-se terapias para dormir melhor e, de preferência, sem culpa.
Porém, não é certo que a culpa seja um obstáculo ao gozo, antes uma das suas formas mais sofisticadas. Talvez seja este um dos "paradoxos do cristianismo", como diria Chesterton.
Em vez de ter criado um obstáculo, o cristianismo teria inventado um novo modo de gozar (Cf. ZizeK, A Marioneta e o Anão) para além do tédio da existência pagã.
Por outro lado, há uma diferença entre apagar a culpa (como se pretende cada vez mais) e assumi-la: neste caso, há um sujeito que responde (mesmo que inconscientemente) por um acto. E como o inconsciente não conhece o tempo (cronológico), há coisas que insistem, na nossa vida, até serem integralmente, subjectivamente assumidas.
Que o diga Günter Grass, o aclamado escritor alemão , que decidiu quebrar o silêncio (sobre a sua participação, no final da segunda guerra mundial, nas Waffen-SS, uma força militar especial do Partido Nazi, condenada nos tribunais de Nuremberga) após sessenta anos (Cf. Descascando a Cebola - Autobiografia 1939-1959).
Não é a culpa uma das provas de que somos humanos?
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2 comentários:
Sade que o diga, não?
A propósito de Sade, Lacan escandalizou quando disse que a sua "Philosophie dans le Boudoir" dava a verdade da "Crítica da Razão Prática" de Kant. Uma certa "verdade", naturalmente...
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