De vez em quando é preciso virar o Édipo do avesso.
Descomplexar o Édipo.
Como todos sabem, foi o dr. Freud que complexou o édipo.
Em Sófocles, o criador do mito, o Édipo não é um tipo complexado, mas decidido na busca da verdade.
Havia em Tebas um monstro ao mesmo tempo assustador e curioso: propunha enigmas e devorava todos aqueles que não soubessem resolvê-los satisfatoriamente. Na ausência da palavra justa, era a pulsão oral (digamos assim, a posteriori) que tomava o seu lugar.
Édipo conseguiu resolver o enigma:
Qual é o ser que de manhã anda com quatro pés, ao meio dia com dois e à tardinha com três?
Resposta de Édipo: o homem.
Ao dizer bem, de forma ajustada, o que estava em causa, Édipo faz perecer o monstro que atormentava os tebanos.
Houve só um problema: Édipo não soube reconhecer-se no monstro de Tebas. Ao contrário de Flaubert, que soube reconhecer-se na mulher que criou, Madame Bovary, Édipo não foi capaz de ver que o homem do enigma era ele próprio.
Daí que tenha reagido mal quando Tirésias, o cego vidente, lhe fez ver a verdade, contra a sua vontade: és tu próprio o assassino que procuras.
Édipo não suporta a verdade e cega-se para não ver.
Agora é cego.
Já pode, ironicamente, ver a verdade.
Como um deus.
Entre o monstro (Édipo Rei) e o deus (Édipo em Colono) há, afinal, uma única superfície moebiana contínua.
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