31.1.05

O monstro de Tebas

De vez em quando é preciso virar o Édipo do avesso.

Descomplexar o Édipo.

Como todos sabem, foi o dr. Freud que complexou o édipo.

Em Sófocles, o criador do mito, o Édipo não é um tipo complexado, mas decidido na busca da verdade.

Havia em Tebas um monstro ao mesmo tempo assustador e curioso: propunha enigmas e devorava todos aqueles que não soubessem resolvê-los satisfatoriamente. Na ausência da palavra justa, era a pulsão oral (digamos assim, a posteriori) que tomava o seu lugar.

Édipo conseguiu resolver o enigma:

Qual é o ser que de manhã anda com quatro pés, ao meio dia com dois e à tardinha com três?

Resposta de Édipo: o homem.

Ao dizer bem, de forma ajustada, o que estava em causa, Édipo faz perecer o monstro que atormentava os tebanos.

Houve só um problema: Édipo não soube reconhecer-se no monstro de Tebas. Ao contrário de Flaubert, que soube reconhecer-se na mulher que criou, Madame Bovary, Édipo não foi capaz de ver que o homem do enigma era ele próprio.

Daí que tenha reagido mal quando Tirésias, o cego vidente, lhe fez ver a verdade, contra a sua vontade: és tu próprio o assassino que procuras.

Édipo não suporta a verdade e cega-se para não ver.

Agora é cego.

Já pode, ironicamente, ver a verdade.

Como um deus.

Entre o monstro (Édipo Rei) e o deus (Édipo em Colono) há, afinal, uma única superfície moebiana contínua.






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