9.3.11

A (me)nina de sua mãe

Nina (Natalie Portman) foi nomeada para assumir o papel de "cisne negro". Antes de assumir este (difícil) papel, ela já tinha sido nomeada uma primeira vez por sua mãe. Nina nasceu para ser perfeita, foi nomeada para tal.

Sua mãe faz de Nina a sua (eterna) menina. Ela conta que desistiu da dança, aos 28 anos, para a dar à luz (dar à luz ganha aqui uma ressonância particular, pois se trata, verdadeiramente, de entregá-la aos holofotes, às luzes da ribalta). Mais do que desistir, a sua mãe transfere para Nina o fardo de ter de realizar um sonho interrompido.  Ela não desistiu do sonho, apenas o transferiu para a filha.Nina parece ter nascido unicamente para realizar o sonho de sua mãe.

E se Nina, em vez de carecer de um diagnóstico (é sempre arriscado diagnosticar personagens de filmes), fosse, ela sim, um diagnóstico do nosso tempo, da nova ordem vigente?

A dezanove de Março de 1974, Lacan escrevia o seguinte: "ao nome do pai substitui-se uma função que não é outra senão a de nomear para, de ser nomeado para qualquer coisa. A mãe é suficiente por si mesma para designar um tal projecto, para indicar o rasto, o caminho. O poder de nomear para institui uma ordem de ferro. Será que este nomear para não é o signo de uma degenerescência catastrófica?"

Ante o declínio da Palavra que dava nome e dizia não - abrindo ao desejo um espaço, uma clareira para respirar -, a  nova ordem de ferro faz de todos nós, de um modo ou de outro, nomeados para isto ou aquilo, sobretudo para a voragem de um gozo ilimitado, de uma pulsão de morte que nos consome, nos dilacera até às vísceras.

É isto que Nina incarna e ilustra singularmente; o resto é décor. Ou pouco mais.

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