Quer seja a pintura, a literatura ou a música, a arte em geral interessa, tem interessado e não pode deixar de interessar a psicanálise. Não porque esta vá no encalço de uma espécie de "psicologia" do autor ou da obra (como tantas vezes se pensou e muitas se praticou), mas porque o artista (o seu saber-fazer) tem algo a mostrar à psicanálise. De alguma forma - é a tese de Lacan - ele precede o psicanalista, trazendo à tona formas inéditas de tratamento do real.
Eis o que exploram dois livros recentes: "Le savoir de l'artiste et la psychanalyse" (Hervé Castanet) e "Glenn Gould, ou l'invention nécessaire" (Vários). Não se trata, em qualquer caso, de "psicologizar" a obra, de dar-lhe um "sentido", mas de pôr em evidência modos inéditos, inventivos, de "tratar o real", para aquém ou para além do sentido.
Quanto à emoção, por exemplo, de escutar Glenn Gould, ela mantém-se intacta. Talvez até um pouco mais viva. Lembro-me ainda, como se fosse hoje, da primeira vez que o vi, na televisão, tocando as "Variações Goldberg", de Bach: aquele jeito desajeitado de sentar-se ao piano e trautear as notas, à medida que ia tocando, ficarão para sempre gravadas na minha alma, essa mesma que Musil dizia retirar-se perante as fórmulas algébricas.
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