26.7.06
A bulimia da lei
Se a recta é o caminho mais curto entre dois pontos, a burocracia é o caminho mais longo.
Que o digam as personagens de Kafka (o autor do "Processo", do "Castelo"...) que não cessam de não chegar ao destino.
Parece que nós, portugueses, somos essencialmente "animais burocráticos": legislamos sobre tudo. Não damos um passo (qualquer dia quase não respiramos) se não está na lei.
Aprecebendo-se disso - e muito bem - o governo decidiu criar há algum templo um plano chamado "simplex" para combater a burocracia.
Mas tal como o sol quando nasce não é para todos, também o "simplex" é só para alguns. Um exemplo é a trapalhada da educação onde se tem assistido a um furor legislativo e contra-legislativo até ao vómito. Por estas bandas, o que parece continuar a reinar é o "complex".
Quando a lei tudo pretende abarcar, acaba por tolher a acção. O excesso de uma é o defeito da outra. A vitória da primeira é a derrota da segunda.
Alguém já nos chamou "chineses da Europa". Descontando, claro está, o fado, o futebol e Fátima. Isso, eles não têm.
Quanto mais domina o "desejo da lei" mais sucumbe a "lei do desejo".
Um exemplo é o que vem consagrado na nova proposta do Estatuto da Carreira Docente. Se esta vingar - e com a famigerada "teimosia" e persistência da sra. ministra e seus pares assim será - os professores não vão fazer mais nada do que auto e hetero-avaliar-se.
Quando tudo se avalia, pouco se produz. A maior parte das coisas que fizeram um dia "acontecimento", se acaso tivessem sido avaliadas segundo as grelhas vigentes, teriam porventura "chumbado".
Em Portugal tudo se legisla porque "nada acontece, nada se inscreve" (José Gil).
Mas é preciso não esquecer - como dizia Lacan nos últimos anos do seu ensino - que "o real é sem lei".
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