3.3.05
Depressão
Bas Jan Ader, Estou Demasiado Triste para To Dizer, 1970
Segundo o último relatório da ONU, Portugal é o país da Europa onde é mais elevada a taxa de crescimento e consumo de fármacos anti-depressivos e afins, apenas superado pela Irlanda. Nalguma coisa tínhamos de ser dos primeiros!
De forma oportuna, como é seu hábito, a TSF apressou-se a dar a palavra aos ouvintes, médicos e alguns psis, para, de viva voz e em nome próprio, cada um dizer o que pensa do assunto. Se não tivesse outro mérito, o Fórum da TSF valeria por isto: enquanto se fala, não se consome!
Muitas foram as razões indicadas para explicar o fenómeno: a situação económica do país e o seu reflexo na vida das pessoas, com a consequente falta de auto-estima; a receita "ilegal" de medicamentos; a pressão social que obriga, segundo uma espécie de imperativo de gozo (como diria Lacan, se tivesse participado no Fórum) as pessoas a ser felizes a todo o preço, custe o que custar, e a estar alegres o tempo inteiro, como se o direito a estar triste tivesse sido pura e simplesmente banido do simbólico; enfim, a precipitação dos próprios médicos que, sem tempo para escutar o sintoma, se apressam a mandar calar o doente: tome lá e cale-se!
Gostava de contribuir para este debate, recolocando as coisas sob a forma de uma altenativa: o logos ou o pharmacon, a fala ou o fármaco? Ou então: não será a fala, em certos casos, o melhor dos fármacos?
Talvez não seja desprezível, nesta história, o facto de que em Portugal (contrariamente ao que se passa em muitos outros países) Freud e os seus seguidores "psi" - sobretudo os que realçaram os poderes da palavra na abordagem e tratamento do sintoma - sejam tão raros e marginalizados.
O paradoxo (como assinala António Damásio, algures, no Erro de Descartes) é que a medicina evoluiu extraordinariamente do ponto de vista científico e tecnológico nos últimos anos, mas estagnou, se não até regrediu, do ponto de vista "humano", isto é, quando se trata não apenas de receitar um fármaco, mas de escutar o sujeito na singularidade do seu sintoma. Como se alguém dissesse, quando o sujeito vai abrir a boca para falar, explicando as suas razões "subjectivas", singulares: cale a boca! Ou então: coma e cale!
Com isso, em vez de abrir a garrafa, lançada ao mar algures, e ler a mensagem endereçada que esta contém, enterra-se ainda mais a rolha e relança-se ao mar.
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3 comentários:
Apesar de existir, como o Filipe afirma, uma marginalização no que se refere a Freud e aos seus seguidores, existe também, a meu ver, a escolha que é a do próprio sujeito em relação ao seu sintoma, e aqui também ele tem a sua quota parte de (des)responsabilidade na "factura" do seu sofrimento. Se é incómodo para a sociedade portuguesa, na figura do psiquiatra, ouvir o sujeito, este (o português, na qualidade de anti-depressivo-dependente), na sua escolha, revela também o quanto difícil lhe é testemunhar as suas verdades.
Talvez seja bom a psicanálise reflectir sobre que rumos tomar face a esta conjuntura.
O sujeito está como que dividido entre um desejo de saber (e de dizer) e uma vontade de não querer saber. Alguém me dizia um dia destes, a propósito deste assunto, que se alguém vai ao "médico" e este não receita qualquer coisa,fica, por assim dizer, desacreditado aos olhos do "doente".
Apesar da medicina ter evoluido muito , infelizmente a maioria das pessoas não estão informadas sobre as doenças mentais e o sofrimento que causa a quem padece delas !É bastante triste que assim seja porque assim os doentes sentem-se muito sózinhos e isso agrava ainda mais os seus sintomas! Torna-se URGENTE e cabe aos médicos desmistificar estas doenças e fazerem cada vez mais chegar informações sobre as mesmas junto dos utentes ! Há certamente muito a fazer ,mas infelizmente não vejo é fazerem nada , me desculpem !
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