29.2.08

Professores sem qualidade

Tem havido, no discurso sobre a a avaliação do desempenho dos professores, uma insistência no "mérito". O mérito é uma "qualidade".

Acontece, porém, que vivemos hoje na era do "homem sem qualidades", para usar a expressão que deu título ao famoso romance de Robert Musil: um romance a que o escritor dedicou quase 30 anos de sua vida e que ficou inacabado.

O Homem sem qualidades é a alegoria da modernidade: o triunfo da razão numérica, a tentativa de reduzir a complexidade do real ao matema.

Quando se pretende casar o matema (sem qualidade) com o mérito (uma qualidade), o resultado é a"retórica da avaliação": só têm qualidade aqueles que preencherem determinados parâmetros quantitativos.

A consequência (previsível) é o imobilismo burocrático: a morte do desejo. À "histerização" dos professores (que se queixam cada vez mais), vai suceder - se me permitem o termo - uma "obsessivação".

Numa completa alienação ao pedido e à exigência do Outro (esmagados pela máquina burocrática da avaliação), os professores vão esquecer o desejo que os move: ensinar.

Mas que desejo é esse?

2.2.08

As teias da lei

A Propósito de algumas críticas que têm surgido de vários quadrantes relativamente à actuação da ASAE, a resposta tem sido, de uma forma geral, a seguinte: "limitamo-nos a fazer cumprir a lei".

Fazer cumprir a lei e legislar profusamente (veja-se, por exemplo, o furor legislativo que tem inundado, nos últimos tempos, como um autêntico dilúvio, a educação, designadamente no que concerne à avaliação dos professores) parecem ser uma clara aposta deste governo.

A lei é uma forma de lidar com os excessos do real: ordenando-os, limitando-os, confinando-os, uniformizando-os, normalizando-os. Como todos os mantos, ela não cobre todo o real e deixa sempre algo a descoberto. Por isso, é necessário continuar a legislar cada vez com maior intensidade e desaforo: remendando, acrescentando, corrigindo, adendando...até à exaustão

A tal ponto que, a certa altura, somos levados a perguntar se a lei, em vez de limitar ou reduzir os excessos do real, não será ela mema o próprio excesso, o excesso fundamental...

Eis onde o direito confina com a psicanálise.