2.1.06

Uma época sem vergonha


De um ponto de vista "analítico", mais do que julgar moralmente os acontecimentos (já Nietzsche, o filósofo, pugnava por uma interpretação para além do bem e do mal), importa destacá-los como "sinais" ou significantes do tempo, como reveladores de algo que muda ou que está a mudar, e suas implicações para o sujeito ou o homem desse tempo.

Um desses sinais reveladores é o fenómeno crescente de "exibicionismo" que parece contaminar todos os domínios, de que a televisão e a Internet são exemplos paradigmáticos na medida em que promovem ou espelham essa tendência no seu grau mais elevado.

Um exemplo disto é o afã com que se mostram, divulgam, publicam, publicitam, exibem...hoje aquelas "coisas" que tradicionalmente havia pudor em revelar, sendo, por isso, guardadas numa gaveta da alma, bem longe dos olhares indiscretos; excepcionalmente, algumas pessoas privilegiadas poderiam ter acesso a essas "intimidades".

O que mudou, entretanto, foi que passamos de uma época em que havia pudor em revelar, mostrar ou exibir certas coisas para uma época em que é "pudor" não as revelar, mostrar ou exibir.

Adiantamo-nos, assim, ao enigma no desejo do Outro propondo-lhe uma resposta: !

(Uma intimidade: dizia-me alguém, recentemente, que já não consegue abrir todos os e-mails que enchem quotidianamente a sua caixa de correio electrónico e ver todas as imagens - supostamente interessantes - que lhe dão a ver. Assim, a uma nova modalidade de gozo acrescenta-se uma nova forma de angústia).


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