26.9.11

O Grande Desígnio

Num livro recente (O Grande Desígnio, Gradiva, 2011), Sthephen Hawking (em colaboração com Leornard Mlodinow) afirma que a filosofia morreu.

A ideia não é nova. O conhecido físico limita-se a repetir algo que já afirmara em Breve História do Tempo. O argumento é simples: uma vez que a filosofia deixou de acompanhar os modernos desenvolvimentos da ciência (em particular ao nível da micro e da macro-física), ela está morta, pelo menos na sua velha aspiração ao conhecimento. Desde Wittgenstein - afirmara Hawking  em Breve História do Tempo - que a única tarefa que cabe à filosofia é a análise da linguagem.

Poderia construir-se toda uma argumentação para mostrar que a filosofia - tantas vezes dada como morta, está viva e ressurge muitas vezes de onde menos se espera; mas a questão para mim é outra: não haverá na busca de uma "teoria de tudo" , como hoje se diz (a tentativa de reduzir tudo - todo o real - à teoria?) um resto de aspiração filosófica, de "metafísica" no coração da ciência?

É um velho sonho hegeliano: que todo o real é (pode ser) racional(izável). E se, ao invés, tudo emergisse de imperfeições, de assimetrias primordiais, de cataclismos e de erros, como perguntava recentemente Marcelo Gleiser (Criação Imperfeita, Círculo de Leitores, 2011)?

E se o real fosse impossível de conhecer ou matema-tizar por completo? Se houvesse um grão de real
que a mó da teoria não conseguisse moer?

13.9.11

Cuidado com o que se diz

Tem-se dito, nos últimos tempos, muita coisa sobre a crise económica e financeira na Europa, em particular sobre a possibilidade de incumprimento ou insolvência da dívida grega.

É certo que o valor da palavra (a deusa Atena falava de Ulisses, no Canto II da Odisseia, como "homem para cumprir acto e palavra") se perdeu entretanto; daí que se insista cada vez mais, por vezes até ao sufoco, na exigência da escrita: tudo deve ser escrito, ainda que não seja para ler.

Contudo, mesmo se desvalorizada, a palavra - aquilo que se diz - não deixou de ter consequências. Tendo perdido o esteio simbólico que  lhe servia de base- ela empenhava o sujeito que a proferia, mas também a comunidade que a tinha por lei - a palavra ficou, por assim dizer, desgovernada, ao saber de ventos e caprichos. Quando alguém (um ministro alemão, por exemplo) abre a boca, as águas dos mercados agitam-se, os ventos fazem tremer as bolsas (entenda-se a palavra como se quiser) e o barco europeu (é uma imagem helénica) fica prestes a afundar...

Daí que a desbocada Angela Merkel se tenha lembrado de dizer a alguns dos seus ministros mais entusiasmados: "Cuidado com o que se diz!"

Será que ela própria acredita nisso?